quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Café - Projeto de Financiamento para a Publicação de Quadrinho Nacional

No Dia do Quadrinho Nacional divulgamos a iniciativa de Gabriel Jardim de financiamento coletivo de uma história em quadrinhos.



Café - Gabriel Jardim from Gabriel Jardim on Vimeo.



Para saber mais acessem Café no Catarse

Negros ganham, em média, pouco mais da metade dos brancos, mostra IBGE

A pesquisa de emprego do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgada nesta quinta-feira (30) apontou que os trabalhadores negros ganharam menos que os brancos, e mulheres ganharam menos que homens no Brasil em 2013.

Pessoas de cor preta ou parda (de acordo com os critérios oficiais de classificação do IBGE) ganhavam, em média, pouco mais da metade (57,4%) do rendimento recebido pelos trabalhadores de cor branca no ano passado.

Em valores, isso dá uma média salarial de R$ 1.374,79 para os trabalhadores negros, enquanto a média dos trabalhadores de cor branca foi de R$ 2.396,74.

Nos últimos dez anos, essa desigualdade diminuiu: desde 2003, o salário dos negros subiu, em média, 51,4%, enquanto o dos brancos aumentou uma média de 27,8%.

Mulheres ganham, em média, 73,6% do salário do homem
Em relação ao gênero, as mulheres ganham, em média, o equivalente a 73,6% do rendimento médio recebido por homens. Em valores, a média do salário das mulheres é de R$ 1.614,95, enquanto a dos homens chega a R$ 2.195,30.

Belo Horizonte é a cidade em que a desigualdade é mais expressiva. Lá, as mulheres recebem, em média, apenas 68,1% do salário dos homens. O Rio de Janeiro tem os melhores índices: as mulheres recebem 75,7% do salário médio dos homens.

Fonte: UOL

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Polícia Civil de SP vai investigar "Especial de Natal" da Porta dos Fundos




A Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), da Polícia Civil de São Paulo, vai investigar se houve algum crime na veiculação do vídeo "Especial de Natal", da produtora Porta dos Fundos. A investigação ocorre por conta de uma representação feita pelo deputado Marcos Feliciano (PSC-SP) contra o vídeo no MP-SP (Ministério Público Estadual de São Paulo), que pede indenização de R$ 1 milhão ao grupo humorístico.

De acordo com a assessoria de imprensa do MP-SP, a representação foi recebida pelo promotor de Justiça de Direitos Humanos José Paulo França Piva, que a encaminhou à Decradi para que investigue as denúncias alegadas por Feliciano, de que o vídeo é pejorativo em relação aos cristãos.

Na representação, Feliciano afirma que a esquete possui "conteúdo altamente pejorativo, utilizando-se inclusive de palavras obscenas, e de forma infame atacou os dogmas cristãos e a fé de milhares de brasileiros que comungam deles, ferindo dialeticamente o direito fundamente à liberdade religiosa". O parlamentar afirmou que, caso a indenização seja concedida pela Justiça, será destinada a Santas Casas de Misericórdia.

No vídeo, publicado no YouTube no dia 23 de dezembro, os humoristas fazem uma paródia da trajetória de Jesus Cristo, desde o nascimento até a crucificação. A sátira vem despertando a ira de grupos cristãos.

No Rio,  a Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família, de Brasília, protocolou no Ministério Público Estadual uma representação criminal contra o grupo. Em Pernambuco, o Ministério Público também foi acionado contra o "Especial de Natal", pelo deputado federal Anderson Ferreira (PR), que afirma que o vídeo ridiculariza a crença cristã.

Marco Feliciano Feliciano também enviou uma carta à Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) pedindo que a suspensão do patrocínio ao grupo. Na internet, também há uma petição on-line exigindo que a marca de cerveja Itaipava deixe de bancar os vídeos do site e "de apoiar o ataque ao Cristianismo".

Segundo o Porta dos Fundos, todos os integrantes do grupo são favoráveis à liberdade de expressão, comportamento e crença. "De maneira nenhuma temos o objetivo de desrespeitar a fé, nem ninguém de nenhuma religião. Temos muito cuidado ao fazer nosso trabalho e também temos nossas responsabilidades", disse por telefone ao UOL o humorista João Vicente de Castro. "Não recebemos nenhuma notificação. Estamos esperando."

Fonte: UOL

O que surpreende é que uma pessoa com um histórico tão notório de intolerância como Marco Feliciano encaminhe algo para ser investigado por tal motivo em vez dele mesmo ser o investigado.



Não custa lembrar que esse é o mesmo que colocou em sua defesa feita ao STF quanto à denúncia de racismo que "Citando a Bíblia [...], africanos descendem de Cão [ou Cam], filho de Noé. E, como cristãos, cremos em bênçãos e, portanto, não podemos ignorar as maldições". Curiosamente apesar deste discurso ter sido verdadeiramente utilizado para justificar a escravização de africanos e de seus descendentes muitas vozes se levantam para tentar desvincular a religião cristã do racismo que seus próprios sacerdotes e instituições utilizam para discriminar.


A bancada evangélica , que seguidamente aparece em levantamentos como a mais ausente, inexpressiva e processada do Congresso  segue uma das grandes promotoras do racismo institucional por seguidamente ameaçar a laicidade do Estado com seus projetos de leis teocráticas. Ficam 2 perguntas para reflexão:

1 - Como pode a religião majoritária (não só no sentido numérico, mas também econômico e político) ser alvo de intolerância?

2 - E os já incessantemente documentados e denunciados casos de intolerância religiosa contra as religiões de afro-brasileiras receberão a mesma atenção e a mesma pressão por apuração?

Jovens e shoppings de SP discutirão 'rolezinhos' caso a caso

Jovens de bairros da periferia de São Paulo e a associação de shopping centers anunciaram nesta quarta-feira (29) que os "rolezinhos" na capital paulista poderão passar a ser feitos em conjunto, se os shoppings aceitarem e comportarem o número de participantes previsto pela organização.

A ideia é combinar a data e o horário com o shopping, que destinará o local específico para o "rolê" –no estacionamento, por exemplo. As análises pelos shoppings que aderirem serão feitas caso a caso.

A negociação entre organizadores de "rolezinhos" e representantes de shoppings foi intermediada pela Secretaria Municipal de Promoção da Igualdade Racial. A conversa foi acompanhada pelo promotor de Justiça Eduardo Valério.

"Eles [os jovens] estavam dispostos a ter uma relação tranquila com os shoppings", disse o secretário da Igualdade Racial, Netinho de Paula (PC do B). Segundo ele, os rapazes reclamaram da falta de espaços públicos que atraiam jovens da periferia.

O objetivo da conversa é pôr fim aos desentendimentos gerados nos últimos "rolezinhos": de um lado, corre-corre e tumulto causado pelos jovens e, de outro, shoppings entrando na Justiça e fechando as portas.

Participaram da reunião cerca de 15 jovens das zonas sul, norte e leste de São Paulo, escolhidos por terem milhares de seguidores ("fãs") nas redes sociais.

Da parte dos shoppings estiveram presentes Luiz Fernando Veiga, presidente da Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers), e representantes do Shopping Metrô Itaquera. Outros shoppings ainda não se posicionaram sobre o assunto. A associação, segundo Veiga, não pode impor as medidas aos shoppings que não foram à reunião, mas irá orientá-los.

"Nós estamos preparados para receber [qualquer pessoa] dentro do esquema para o qual o shopping foi estruturado. Se passa desse limite, nós temos problemas, e aí temos que tomar algumas providências no sentido de organizar. É exatamente o que estamos fazendo aqui hoje e o que combinamos com esses jovens: que, daqui para frente, tentaremos fazer com que tudo isso, que criou tanta celeuma, passe a ser apenas mais uma atividade cultural, e nós estamos a fim de apoiá-la", disse o presidente da Abrasce.

Segundo o MC Chaverinho, 20, representante da zona leste, a ideia é marcar nos shoppings encontros menores, convocados em grupos fechados nas redes sociais –e avisar os estabelecimentos.

"Quem vai dimensionar o evento e cuidar da segurança é o shopping", disse o secretário Netinho de Paula.

Eventos maiores serão feitos em parques e praças, anunciaram os jovens. Para isso, será marcada na próxima semana uma reunião com as secretarias municipal e estadual da Cultura e da Segurança.

Nesses encontros, os jovens admitem que poderão aceitar patrocínio dos shoppings ou das marcas de roupas que costumam usar.

DISTÚRBIOS

Os jovens se comprometeram ainda a orientar seus "fãs", pelas redes sociais, a evitar violência e tumulto e a retirar do meio dos "rolezinhos" pessoas mal-intencionadas que possam aparecer para praticar vandalismo ou furtos.

"Mas não somos responsáveis por um cara armado que vá ao shopping durante o 'rolezinho'", afirmou Chaverinho.

Fonte: Folha

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Joaquim Barbosa sobre o racismo: diplomacia brasileira “é muito discriminatória”

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa
STF


Em 1993, quando deixou Paris com um título de doutor recém-conquistado na Universidade Panthéon-Assas, Joaquim Benedito Barbosa Gomes não imaginaria que, quase 20 anos depois, seria o primeiro negro a assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal. A nomeação, entretanto, é uma exceção em um país onde o racismo se esconde atrás de piadas e os negros permanecem longe de ter acesso às mesmas oportunidades que os brancos, apesar de comporem a maioria da população. Em entrevista exclusiva à RFI, Barbosa afirma que um dos piores exemplos é a face brasileira no exterior: a diplomacia, segundo ele, ainda “é muito discriminatória”.
Durante sua curta passagem por Paris, na semana passada, o presidente do STF foi recebido como convidado de honra no Conselho Constitucional francês, uma das instituições de maior prestígio do país. Poucos minutos antes de embarcar em um trem rumo a Londres, onde cumpre a segunda etapa de compromissos oficiais na Europa, ele conversou com a RFI.

Na semana passada, enquanto os jornalistas brasileiros aguardavam o senhor em um café na praça da Sorbonne, um garçom francês, negro, reconheceu o seu nome e sabia quem o senhor era. O senhor já é reconhecido no exterior?
Eu sempre tive o hábito de parar na praça da Sorbonne, não somente para tomar um café mas para estudar. Eu gostava de ficar ali. Mas em relação a um garçom ter me reconhecido, isso representa o fato de que os negros se reconhecem em qualquer lugar do mundo. Eles se reconhecem uns nos outros.

A sua carreira é de exceção no Brasil: um negro de origem humilde que chega à presidência do STF. Hoje, foram implantadas as cotas, por exemplo, entre outras ações para integrar melhor os negros na sociedade, inclusive em altos cargos. O senhor acha que a situação melhorou?
As coisas melhoraram um pouco nestes últimos 20 anos. Mas eu acho que nós ainda precisamos de bastante cotas em diversas áreas, porque 50 ou 51% da população é formada por negros. Entretanto, eles ainda se encontram em situações de inferioridade, sofrem discriminação, conseguem empregos ruins. No Brasil, nós não vemos os negros em cargos de direção nas empresas, ao contrário de outros países. A nossa diplomacia é formada em 99% por brancos e é muito discriminatória. Ou seja, ainda temos muito a fazer. Muito mesmo.

Na Europa, essa pouca representação dos negros nos altos cargos no Brasil, um país tão miscigenado, causa estranheza. O senhor acha que o Brasil é um país racista?
É um país onde o racismo é latente. Não é explícito: é latente. Ele é disfarçado, e se mostra nas situações nas quais os negros são excluídos. Quando alguém é surpreendido em um ato racista, ele muda de discurso, faz como se não fosse nada, diz que era uma brincadeira, reafirma que o país é uma mistura de raças, lembra que tem uma tia negra. Porém, em tudo aquilo que conta de verdade, na economia, nas posições de comando, os negros são excluídos.

Recentemente, a ministra francesa da Justiça, Christiane Taubira, foi alvo de vários ataques racistas. O senhor se encontrou com ela na semana passada. Vocês conversaram sobre este assunto?
Sim, nós falamos. Eu acho isso vergonhoso para a França. Uma mulher com muitas qualidades, como a ministra da Justiça Taubira, ser alvo de atos de machismo e de racismo. Nós estudamos na mesma faculdade de Direito em Paris, Panthéon-Assas, embora não tenhamos nos conhecido na época. Ela estudava em Assas e eu fazia o doutorado em Panthéon. E nós conversamos sobre incidentes racistas que nós dois tivemos na época. Houve brigas envolvendo a extrema-direita no campus, coisas assim. Eu acho tudo isso assustador. Porém, na França pelo menos existe o debate, enquanto, no Brasil, tudo fica escondido. Tudo fica como se fosse uma brincadeira. As medidas necessárias [contra o racismo] não são tomadas. O assunto é tratado com superficialidade. O assunto não é levado a sério, e este é o problema.

Durante as manifestações do ano passado, o senhor era visto como um ídolo. O seu nome era evocado para a presidência da República. Nos últimos meses, entretanto, o senhor virou alvo da imprensa, como por exemplo sobre o pagamento de diárias durante a sua viagem à Europa. Como o senhor sentiu essa mudança?
Isso não me incomoda. Isso faz parte do caráter um pouco provinciano do debate público no Brasil. Eu gostaria de debater as coisas sérias. É isso que me interessa. Mas tem uma certa imprensa sem escrúpulos no Brasil, pessoas pagas por fundos governamentais e que só querem saber de me atacar, mas eu só faço o meu trabalho. Faço o meu trabalho e não estou nem aí para essas pessoas.

Questionar a sua honestidade o incomoda?
São os brasileiros que devem dizer se sou honesto, e não estes maus-caracteres.

Fonte: RFi Português

domingo, 26 de janeiro de 2014

Ex-escravos lembram rotina em fazenda nazista no interior de SP

Símbolo na bandeira do time de futebol no interior de São Paulo era uma suástica
Foto: BBC

Em uma fazenda no interior de São Paulo, 160 quilômetros a oeste da capital, um time de futebol posa para uma foto comemorativa. Mas o que torna a imagem extraordinária é o símbolo na bandeira do time - uma suástica.

A foto, provavelmente, foi tirada após a ascensão nazista na Alemanha, na década de 1930.
"Nada explicava a presença dessa suástica aqui", conta José Ricardo Rosa Maciel, ex-dono da remota fazenda Cruzeiro do Sul, perto de Campina do Monte Alegre, que encontrou a foto, por acaso, um dia.

Mas essa foi, na verdade, sua segunda e intrigante descoberta. A primeira tinha ocorrido no chiqueiro. "Um dia, os porcos quebraram uma parede e fugiram para o campo", ele disse. "Notei que os tijolos tinham caído. Achei que estava tendo alucinações". Na parte debaixo de cada tijolo estava gravada uma suástica. 

É sabido que no período que antecedeu a Segunda Guerra, o Brasil tinha fortes vínculos com a Alemanha Nazista. Os dois países eram parceiros comerciais e o Brasil tinha o maior partido fascista fora da Europa, com mais de 40 mil integrantes.

Mas levou anos para que Maciel, com o auxílio do historiador Sidney Aguillar Filho, conhecesse a terrível história que conectava sua fazenda aos fascistas brasileiros.

Moradores do interior de SP ainda guardam as lembranças referentes à suástica
Foto: BBC






Ação Integralista
Filho descobriu que a fazenda tinha pertencido aos Rocha Miranda, uma família de industriais ricos do Rio de Janeiro. Três deles - o pai, Renato, e dois filhos, Otávio e Osvaldo - eram membros da Ação Integralista Brasileira (AIB), organização de extrema direita simpatizante do Nazismo.

A família às vezes organizava eventos na fazenda, recebendo milhares de membros do partido. Mas também existia no lugar um campo brutal de trabalhos forçados para crianças negras abandonadas.

"Descobri a história de 50 meninos com idades em torno de 10 anos que tinham sido tirados de um orfanato no Rio", conta o historiador. "Foram três levas. O primeiro grupo, em 1933, tinha dez (crianças)".

Aloysio Silva era conhecido apenas pelo número 23
Foto: BBC



Osvaldo Rocha Miranda solicitou a guarda legal dos órfãos, segundo documentos encontrados por Filho. O pedido foi atendido.

"Ele enviou seu motorista, que nos colocou em um canto", conta Aloysio da Silva, um dos primeiros meninos levados para trabalhar na fazenda, hoje com 90 anos de idade.

"Osvaldo apontava com uma bengala - 'Coloca aquele no canto de lá, esse no de cá'. De 20 meninos, ele pegou dez".

"Ele prometeu o mundo - que iríamos jogar futebol, andar a cavalo. Mas não tinha nada disso. Todos os dez tinham de arrancar ervas daninhas com um ancinho e limpar a fazenda. Fui enganado".


As crianças eram espancadas regularmente com uma palmatória. Não eram chamadas pelo nome, mas por números. Silva era o número 23.

Cães de guarda mantinham as crianças na linha.


"Um se chamava Veneno, o macho. A fêmea se chamava Confiança", conta Silva, que ainda mora na região. "Evito falar sobre esse assunto".

Argemiro dos Santos é outro dos sobreviventes. Quando menino, foi encontrado nas ruas e levado para um orfanato. Um dia, Rocha Miranda veio buscá-lo.

"Eles não gostavam de negros", conta Santos, hoje com 89 anos.

Até as vacas da fazenda recebiam a suástica
Foto: BBC


"Havia castigos, deixavam a gente sem comida ou nos batiam com a palmatória. Doía muito. Duas batidas, às vezes. O máximo eram cinco, porque uma pessoa não aguentava".

"Eles tinham fotografias de Hitler e você era obrigado a fazer uma saudação. Eu não entendia nada daquilo".

Alguns dos descendentes da família Rocha Miranda dizem que seus antepassados deixaram de apoiar o Nazismo antes da Segunda Guerra Mundial.

Maurice Rocha Miranda, sobrinho-bisneto de Otávio e Osvaldo, também nega que as crianças eram mantidas na fazenda como "escravos".

Em entrevista à Folha de São Paulo, ele disse que os órfãos na fazenda "tinham de ser controlados mas nunca foram punidos ou escravizados".

O historiador Sidney Aguillar Filho, no entanto, acredita nas histórias dos sobreviventes. E apesar da passagem do tempo, ambos Silva e Santos - que nunca mais se encontraram desde o tempo em que viveram na fazenda - fazem relatos muito parecidos e perturbadores de suas experiências.

Para os órfãos, os únicos momentos de alegria eram os jogos de futebol contra times de trabalhadores das fazendas locais, como aquele em que foi tirada a foto onde se vê a bandeira com a suástica (o futebol tinha papel fundamental na ideologia integralista).

Argemiro Santos ainda guarda a medalha de ouro que ganhou
Foto: BBC


"A gente se reunia para bater bola e a coisa foi crescendo", diz Santos. "Tínhamos campeonatos, éramos bons de futebol."

Mas depois de vários anos, ele não aguentava mais. "Tinha um portão (na fazenda) e um dia eu o deixei aberto", ele conta. "Naquela noite, eu fugi. Ninguém viu".

Santos voltou ao Rio onde, aos 14 anos de idade, passou a dormir na rua e trabalhar como vendedor de jornais. Em 1942, quando Brasil declarou guerra contra a Alemanha, Santos se alistou na Marinha como taifeiro, servindo mesas e lavando louça.

Depois de trabalhar para nazistas, Santos passou a lutar contra eles. "Estava apenas prestando um serviço para o Brasil", explica. "Não sentia ódio por Hitler, não sabia quem ele era".


Santos saiu em patrulha pela Europa e depois passou um período, ainda durante a guerra, trabalhando em navios que caçavam submarinos na costa brasileira. Hoje, Santos é conhecido, na comunidade onde vive, pelo apelido de Marujo. E se orgulha de um certificado e uma medalha que recebeu em reconhecimento por seus serviços durante a guerra.

Mas ele também é famoso por suas proezas futebolísticas, jogando como meio de campo em vários grandes times brasileiros na década de 1940. "Naquela época, não existiam jogadores profissionais, éramos todos amadores", diz. "Joguei para o Fluminense, Botafogo, Vasco da Gama... Os jogadores eram todos vendedores de jornais e lustradores de sapatos".

Hoje, Santos vive uma vida tranquila com a esposa, Guilhermina, no sudoeste do Brasil. Eles estão casados há 61 anos. "Eu gosto de tocar meu trompete, de sentar na varanda e tomar uma cerveja gelada. Tenho muitos amigos e eles sempre aparecem para bater papo", conta.

As lembranças do tempo difícil que passou na fazenda, no entanto, são difíceis de apagar.
"Quem diz que sempre teve uma vida boa desde que nasceu está mentindo", diz Santos. "Na vida de todo mundo acontecem coisas ruins."

O INTEGRALISMO BRASILEIRO
O integralismo brasileiro foi um movimento político fascista fundado no País em 1932
Adotou alguns dos conceitos básicos do fascismo europeu - uma ala paramilitar uniformizada, demonstrações de rua e retórica anti-Marxista
Pregava o nacionalismo como identidade espiritual compartilhada
Apesar de seu slogan - "União de todas as raças e povos" - muitos dos seus integrantes eram antisemitas
O movimento foi incorporado pelo presidente Getúlio Vargas, que instaurou uma ditadura no Brasil em 1937
Inicialmente, o Brasil adotou posição de neutralidade na Segunda Guerra Mundial, mas em 1942 se uniu aos Aliados
Vargas foi forçado a deixar o posto em 1954, suicidando-se
Após a Segunda Guerra, vários nazistas fugiram para a América do Sul - o notório Josef Mengele conseguiu evitar captura durante décadas e morreu no Brasil em 1979

Fonte: Terra





sábado, 4 de janeiro de 2014

O racismo em números - por Miguel Martins


Quando publicou Casa-Grande & Senzala em 1933, Gilberto Freyre não tinha a seu dispor um grande volume de dados sociológicos sobre a população brasileira. O IBGE foi criado um ano depois e o Ipea apenas na década de 1960. Se tivesse acesso a pesquisas que comprovassem a relação intrínseca entre pobreza e cor de pele no Brasil, hoje abundantes, talvez sua teoria da democracia racial brasileira fosse um pouco diferente. Ao ser confrontado com as estatísticas, o racismo brasileiro, sustentado em três séculos de escravidão, desvela-se como uma verdade factual.

A conexão entre a miséria e a origem racial é tão definitiva no País que programas de transferência de renda destinados a eliminar a extrema pobreza só poderiam fazê-lo ao beneficiar os negros, mesmo sem adotarem políticas afirmativas de raça. Na quinta-feira 19, a ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello, divulgou um trabalho de decomposição dos beneficiários do Brasil Sem Miséria, que inclui o Bolsa Família, o Brasil Carinhoso e o Pronatec, entre outros. Cerca de três quartos dos beneficiados, mostra o levantamento, são negros.

No início do Brasil Sem Miséria, em 2011, criado para alcançar a parcela da população apta a receber benefícios mas ainda não registrada no Cadastro Único, o ministério almejava incluir cerca de 16 milhões de brasileiros em situação de extrema pobreza. Segundo o IBGE, 71% eram pretos ou pardos à época. Natural, portanto, a pesquisa de 2013 revelar que os maiores beneficiados pelas políticas de transferência de renda têm a pele escura. De acordo com os dados divulgados por Tereza Campello, 73% dos cadastrados no Bolsa Família são pretos ou pardos autodeclarados. Em relação a outros benefícios, a proporção é ainda maior.

Segundo a ministra, os dados são consequência da desigualdade racial no Brasil. “Embora não exerçamos uma política afirmativa de convocar os negros, eles acabam mais favorecidos por serem os mais vulneráveis”, comenta. “Estamos em uma luta aberta contra a discriminação dos pobres. Assim como alguns chamavam os escravos no Brasil de preguiçosos, muitos falam o mesmo de quem recebe benefícios do governo. Ao lutar contra o preconceito em relação aos pobres, construímos uma trajetória de cidadania para a população mais necessitada, de maioria negra.”

Embora o Bolsa Família não se paute por uma política de afirmação racial, há outros fatores que estimulam um número maior de negros atendidos. O estudo Vozes da Nova Classe Média, realizado pelo Ipea neste ano, indicou que, ao declarar-se preto, as chances de um candidato obter o benefício aumentam em 10%. Segundo a ministra, trata-se quase de um “preconceito invertido”. “Quando alguém vai fazer seu cadastro no Bolsa Família, a rede de assistência social tenta aferir o máximo possível de informações sobre a renda de um candidato. Se uma pessoa toda produzida, loira e de olho azul for pedir o benefício, a chance de levantar suspeição é maior. É mais crível quando um negro pede o benefício, pois quem analisa realmente acredita no grau de vulnerabilidade.”

Um dado bastante comemorado pelo ministério é a parcela de 65% de negros entre os matriculados no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego. O fim da exigência de nível médio para alguns cursos profissionalizantes, ressalta a ministra, e uma melhora na divulgação foram responsáveis pelo alto número de negros contemplados. “Boa parte das vagas era ofertada no Sebrae, Senai e Sesc, que chegavam mais no trabalhador formal. Agora oferecemos os cursos do Pronatec nos centros de referência de assistência social, localizados em geral em bairros e vilas populares.”

Quanto mais específico é o programa social, maior o número de negros beneficiados. Em relação ao Brasil Carinhoso, que atende famílias com filhos de até 15 anos de idade, a proporção de pretos ou pardos chega a 77%. O número pode ser explicado pela taxa de fecundidade. Segundo um estudo do Ipea de 2011, enquanto entre os negros a média de filhos por mulher é de 2,1, na população branca é de 1,6.

Nos programas direcionados à população rural, a proporção de negros atendidos é ainda mais alta, consequência de sua maior concentração no campo. Nas cidades, 48% da população é negra, e no meio rural, 61%. Os programas Água para Todos e o Fomento às Atividades Produtivas têm entre seus beneficiados quase 80% de negros. No caso do Bolsa Verde, que complementa a renda de quem adota práticas sustentáveis, chega a 92%.

A iniciativa de estender o Bolsa Família às comunidades quilombolas é o que mais se aproxima de uma política afirmativa no Brasil Sem Miséria. Segundo o ministério, há 2.197 comunidades quilombolas reconhecidas, com uma população estimada de 1,17 milhão de indivíduos.

Símbolo da resistência contra as senzalas, os quilombos perderam sua condição original de esconderijos de escravos fugidos do cativeiro. Mas a miséria e o alto nível de desnutrição infantil expõem os efeitos duradouros da escravidão. Por causa da distância e do isolamento, o governo tem desenvolvido formas alternativas de atuação. “Nas versões antigas do Cadastro Único, não eram feitas perguntas sobre públicos diferenciados. Agora conseguimos beneficiar ciganos e quilombolas mesmo sem endereço fixo”, diz Tereza Campello. Hoje são 261,5 mil quilombolas autodeclarados inscritos no Bolsa Família.

Fonte: Geledés

Empresária pagará R$ 15 mil por racismo a vigilante em Muriaé

Uma empresária foi condenada a pagar R$ 15 mil de indenização por danos morais ao vigilante de um hospital de Muriaé, a quem agrediu verbalmente, fazendo referências ofensivas à cor da pele do trabalhador. A decisão é da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que manteve sentença proferida pela comarca.

A vítima narrou nos autos que trabalhava como vigilante no pronto-socorro do hospital São Paulo quando uma criança que acabara de ser mordida por um cachorro chegou ao local, acompanhada da tia. O menor já estava sendo atendido, quando também chegou ao hospital um casal de empresários, que se identificou como pais da criança. O vigilante avisou ao casal que precisaria comunicar à acompanhante da criança que eles haviam chegado, para que fosse feita uma troca, pois as normas do estabelecimento não permitiam a presença de mais de um acompanhante por paciente.

De acordo com o vigilante, os réus começaram então a agir de maneira exaltada e grosseira, insistindo em ir até a criança, chegando a invadir área de acesso restrito, dando socos e pontapés na porta de entrada do local. Passaram também a proferir ofensas ao trabalhador, chamando-o de "macaco" e "negro fedorento", entre outras agressões verbais, acompanhadas de palavras de baixo calão. Policiais militares que atendiam a uma ocorrência nas dependências do hospital tentaram acalmá-los, sem sucesso, e assim foi dada voz de prisão ao casal, que foi preso em flagrante pelos crimes de injúria, desobediência e resistência.

Afirmando que se sentiu humilhado e constrangido pelas ofensas, o homem entrou na justiça contra o casal, pedindo indenização por danos morais. Alegou que os réus manifestaram juízo de valor depreciativo com relação à sua cor, além de tê-lo insultado, ofendendo sua honra e reputação, na frente de várias pessoas, em seu próprio local de trabalho.

Nervosos e aflitos
Em sua defesa, os pais da criança afirmaram que estavam em um evento quando foram informados por uma filha, que chorava ao telefone, que o filho deles, de apenas 8 anos, havia sido mordido por um pit bull e se encontrava no Pronto Socorro. Disseram que de fato se dirigiram para o local nervosos e aflitos, pois não sabiam qual era o estado de saúde da criança e haviam sido informados de que o menino chorava muito, chamando pelos pais. Alegaram que o funcionário os impediu de ver o menino, em tom imperativo e arrogante, mesmo diante do pedido insistente deles, e que foram eles, os pais, que sugeriram a troca de acompanhantes, pois queriam estar com a criança naquele momento.

Entre outros pontos, o casal afirmou ainda que em momento algum agiu com grosseria e que o funcionário se recusou a fazer a troca de acompanhante. Disseram que não agrediram verbal ou fisicamente o vigilante, que foi permitido a eles entrar na sala de cirurgia e que estavam ali quando foram algemados por policiais.

Em Primeira Instância, a mãe da criança foi condenada a pagar ao vigilante R$ 15 mil por danos morais, já o pedido do segurança em relação ao pai do menor foi julgado improcedente.

Diante da sentença, ambas as partes recorreram: o vigilante pediu o aumento do valor da indenização e a mulher pediu sua absolvição, sustentando que ocorreu apenas mera discussão entre as partes e não houve dano moral.

Ao analisar os autos, a desembargadora relatora, Mariza Porto, avaliou que a injúria racial estava mais do que comprovada pelo auto de prisão em flagrante e pelos relatos de testemunhas. Além disso, o processo criminal em tramitação corroborava a ofensa sofrida pelo segurança do hospital.

Na avaliação da desembargadora, o vigilante "apenas exerceu o seu dever legal de manter a norma do hospital e a manutenção da ordem do local", tendo sido acertada a sentença que condenou a empresária.

Considerando adequado o valor da indenização arbitrada em Primeira Instância, a relatora manteve a sentença, sendo seguida, em seu voto, pelos desembargadores Paulo Balbino e Marcos Lincoln.

Fonte: Geledés

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Mulher morre no interior da Bahia após aplicar produto para alisar o cabelo


A Polícia Civil da Bahia está investigando a morte de uma moradora de Barreiras, a 830 km de Salvador, que pode ter sido causada pela aplicação de um alisante e relaxante capilar. A dona de casa Maria Cleide Lopes da Silva, de 36 anos, morreu na madrugada desta sexta-feira (3), no Hospital Eurico Dutra.

O produto a base de guanidina, sódio e lithium foi aplicado no dia 25 de dezembro pelo cabeleireiro e marido da vítima, Matire Oliveira, de 46 anos. "Eu dizia a ela que não usasse esse produto, mas ela gostava do efeito dele", explicou o cabeleireiro, acrescentando que a esposa fazia relaxamento com o produto, da marca Salon Line, há pelo menos 10 anos.

O marido também contou à polícia que a mulher só começou a sentir febre e dores no corpo no dia 30 e chegou a passar por unidades de saúde do município, mas só foi internada nessa quinta (2) no Hospital Eurico Dutra.

O atestado de óbito de Maria Cleide relata que uma intoxicação seguida de um choque anafilático foram a causa da morte. No entanto, o delegado titular de Barreiras, Francisco Carlos de Sá, responsável pelo inquérito, solicitou exames à perícia para comprovar se o produto apresentado pela família realmente provocou o óbito.

Ainda segundo o delegado, o fabricante e o fornecedor do alisante serão convocados a prestar depoimento. A reportagem do NE10 Bahia não conseguiu contato com o fabricante do produto.

Fonte: NE10
 
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