Se os debates sobre o sistema de cotas nas universidades atentaram para a baixa representatividade dos negros entre estudantes de cursos superiores do Brasil, um novo estudo vai mostrar que a segregação racial é ainda mais forte do outro lado da sala de aula. Pesquisa pioneira do professor do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília (UnB) José Jorge de Carvalho constatou que nas maiores e mais importantes instituições de ensino superior (IES), o número de professores negros (pretos e pardos) não chega, em média, a 1%. Esse percentual aponta para a perpetuação da desigualdade racial em todas as áreas de poder da sociedade brasileira. Vemos a influência de docentes das universidades de maior prestígio na tomada de decisões sobre os rumos da nação, tanto no controle da economia, como nos postos chaves do Judiciário e da administração superior; e esses docentes são invariavelmente brancos em um país em que os negros são 45% da população.
Em 2000, quando José Jorge Carvalho decidiu iniciar sua pesquisa, a idéia era fazer um censo racial apenas na UnB. Porém, quando percebeu o quanto os negros eram pouco representados na universidade, resolveu avaliar a mesma situação no resto do país. De 12 instituições analisadas, seis são aqui destacadas devido à sua importância acadêmica e à sua influência decisiva na estrutura de poder do Estado brasileiro. Em cada uma das universidades, a contagem foi feita por colegas professores, em sua maioria negros. Na UnB, José Jorge teve a ajuda de professores e alunos para fazer a conta. Ao todo, cerca de 20 docentes se envolveram na pesquisa. Carvalho explica que realizou um censo de identificação e não de entrevista.
Entre as instituições analisadas, o antropólogo destaca seis: a Universidade de São Paulo (USP), a Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Estadual de Campinas (Unicamp), a Federal de Minas Gerais (UFMG), a Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a de Brasília (UnB). Entre essas, a primeira foi considerada o caso mais crítico. Na USP, dos 4.705 docentes em atividade, apenas cinco são negros, o que representa em torno de 0,1%. Já a UnB foi a que apresentou o que poderíamos chamar, ironicamente, de “melhor” resultado: dos 1.500 professores, 15 são negros, o que equivale a 1%. O número total de docentes encontrados nessas seis instituições foi de 15.866, entre os quais apenas 67 negros. A média geral não passa, portanto, de 0,5% de docentes negros.
Para Carvalho, essas seis universidades refletem e reproduzem uma rede de poder que influencia praticamente todo o ensino superior e a pesquisa no país. “Tudo passa por ali. Se os negros estão excluídos dessas instituições, eles estão fora da elite do ensino e da pesquisa no Brasil inteiro”, aponta. Isso mostra que o país é um desastre mundial em termos de exclusão racial na docência superior e na pesquisa. De acordo com o professor, não há solução imediata para o problema. E, sem intervenção, não haverá saída nem a longo prazo.
Na opinião do antropólogo, o sistema de cotas na graduação é apenas o primeiro passo para mudar essa situação. "Mas elas sozinhas não resolvem o problema porque, daqui a pouco, os cotistas formados vão querer fazer pós", observa. Por isso é preciso estudar medidas para incluir negros no doutorado e na docência, já que o racismo afeta todas as dimensões do ensino superior.
Propostas
Em sua pesquisa, Carvalho, autor do Plano de Metas para a Integração Social, Étnica e Racial da UnB, que inclui o sistema de cotas, apresenta uma alternativa para tentar melhorar o ingresso de negros na carreira acadêmica: o chamado acesso preferencial. A proposta não reservará vagas, como é feito com as cotas, mas, sim, dará preferência para negros que queiram entrar na pós-graduação, na docência superior e na carreira de pesquisador.
O pesquisador acredita que, além do sistema de preferências de vaga, os alunos negros deveriam também receber bolsas, tendo em vista que a grande maioria deles é pobre. O sistema funcionaria da seguinte forma: cada universidade receberia um determinado número de bolsas de mestrado e doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e as distribuiria entre os institutos. Os candidatos negros aprovados para a pós-graduação teriam preferência para recebê-las, segundo um número mínimo definido pelos institutos.
Nas cinco mil vagas que o Ministério da Educação (MEC) abrirá para professores, por exemplo, o professor sugere que os negros que fossem aprovados nos concursos deveriam ter preferência de contratação. “Uma oportunidade como essa poderá não se repetir em uma década e ainda assim os docentes brancos no poder estão dispostos a perpetuar essa exclusão racial escandalosa. Não é possível que o MEC ainda não tenha atentado para esse fato”, diz.
Na carreira de pesquisador, uma categoria para quem tem a bolsa de Produtividade e Pesquisa do CNPq, cujas vagas são muito disputadas, haveria também uma preferência de ingresso. Carvalho sugere que se repensem critérios de julgamento e mérito nas aprovações, na medida em que as comissões do CNPq indicam para a bolsa apenas os candidatos considerados melhores. Nesse caso, o que se propõe é uma avaliação qualitativa das condições de ingresso de um professor negro, analisando o currículo e o projeto de pesquisa do candidato dentro de uma política deliberada de formação de pesquisadores negros.
Fonte: UNB
Publicado em 20/07/2007.
Conselho Estudal dos Direitos do Negro
Em 2000, quando José Jorge Carvalho decidiu iniciar sua pesquisa, a idéia era fazer um censo racial apenas na UnB. Porém, quando percebeu o quanto os negros eram pouco representados na universidade, resolveu avaliar a mesma situação no resto do país. De 12 instituições analisadas, seis são aqui destacadas devido à sua importância acadêmica e à sua influência decisiva na estrutura de poder do Estado brasileiro. Em cada uma das universidades, a contagem foi feita por colegas professores, em sua maioria negros. Na UnB, José Jorge teve a ajuda de professores e alunos para fazer a conta. Ao todo, cerca de 20 docentes se envolveram na pesquisa. Carvalho explica que realizou um censo de identificação e não de entrevista.
Entre as instituições analisadas, o antropólogo destaca seis: a Universidade de São Paulo (USP), a Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Estadual de Campinas (Unicamp), a Federal de Minas Gerais (UFMG), a Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a de Brasília (UnB). Entre essas, a primeira foi considerada o caso mais crítico. Na USP, dos 4.705 docentes em atividade, apenas cinco são negros, o que representa em torno de 0,1%. Já a UnB foi a que apresentou o que poderíamos chamar, ironicamente, de “melhor” resultado: dos 1.500 professores, 15 são negros, o que equivale a 1%. O número total de docentes encontrados nessas seis instituições foi de 15.866, entre os quais apenas 67 negros. A média geral não passa, portanto, de 0,5% de docentes negros.
Para Carvalho, essas seis universidades refletem e reproduzem uma rede de poder que influencia praticamente todo o ensino superior e a pesquisa no país. “Tudo passa por ali. Se os negros estão excluídos dessas instituições, eles estão fora da elite do ensino e da pesquisa no Brasil inteiro”, aponta. Isso mostra que o país é um desastre mundial em termos de exclusão racial na docência superior e na pesquisa. De acordo com o professor, não há solução imediata para o problema. E, sem intervenção, não haverá saída nem a longo prazo.
Na opinião do antropólogo, o sistema de cotas na graduação é apenas o primeiro passo para mudar essa situação. "Mas elas sozinhas não resolvem o problema porque, daqui a pouco, os cotistas formados vão querer fazer pós", observa. Por isso é preciso estudar medidas para incluir negros no doutorado e na docência, já que o racismo afeta todas as dimensões do ensino superior.
Propostas
Em sua pesquisa, Carvalho, autor do Plano de Metas para a Integração Social, Étnica e Racial da UnB, que inclui o sistema de cotas, apresenta uma alternativa para tentar melhorar o ingresso de negros na carreira acadêmica: o chamado acesso preferencial. A proposta não reservará vagas, como é feito com as cotas, mas, sim, dará preferência para negros que queiram entrar na pós-graduação, na docência superior e na carreira de pesquisador.
O pesquisador acredita que, além do sistema de preferências de vaga, os alunos negros deveriam também receber bolsas, tendo em vista que a grande maioria deles é pobre. O sistema funcionaria da seguinte forma: cada universidade receberia um determinado número de bolsas de mestrado e doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e as distribuiria entre os institutos. Os candidatos negros aprovados para a pós-graduação teriam preferência para recebê-las, segundo um número mínimo definido pelos institutos.
Nas cinco mil vagas que o Ministério da Educação (MEC) abrirá para professores, por exemplo, o professor sugere que os negros que fossem aprovados nos concursos deveriam ter preferência de contratação. “Uma oportunidade como essa poderá não se repetir em uma década e ainda assim os docentes brancos no poder estão dispostos a perpetuar essa exclusão racial escandalosa. Não é possível que o MEC ainda não tenha atentado para esse fato”, diz.
Na carreira de pesquisador, uma categoria para quem tem a bolsa de Produtividade e Pesquisa do CNPq, cujas vagas são muito disputadas, haveria também uma preferência de ingresso. Carvalho sugere que se repensem critérios de julgamento e mérito nas aprovações, na medida em que as comissões do CNPq indicam para a bolsa apenas os candidatos considerados melhores. Nesse caso, o que se propõe é uma avaliação qualitativa das condições de ingresso de um professor negro, analisando o currículo e o projeto de pesquisa do candidato dentro de uma política deliberada de formação de pesquisadores negros.
Fonte: UNB
Publicado em 20/07/2007.
Conselho Estudal dos Direitos do Negro
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