segunda-feira, 9 de julho de 2012

Pesquisa mostra que número de terreiros cresceu nas últimas duas décadas




Eles nasceram Bruno de Souza, Renato Araújo e Aída Rodrigues. Mas a fé os transformou em Bruno de Omolu, Renato D’Ogunjá e Matambareuá de Yansã. Perseguidos desde os tempos de escravidão, os sacerdotes dos cultos afro vislumbram novo horizonte. E, cada vez mais, expandem suas raízes em solo fluminense. É o que revela o Mapeamento das Casas de Religiões de Matriz Africana do Rio de Janeiro, realizado por pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).

O estudo revela que a maioria das 847 casas mapeadas foi fundada a partir da década de 90. O que contraria a previsão de estudiosos do campo religioso, que anunciavam um encolhimento do culto de matriz afro nos últimos anos. A crença, que resistiu aos navios negreiros, às senzalas e à repressão policial, também floresce em tempos de intolerância religiosa.

— Nenhuma casa foi aberta antes de 1930. A grande maioria é bem recente. Apesar de sofrer com o assédio das seitas, as religiões de matriz africana se fortaleceram na fé e aumentaram numericamente — explica a pesquisadora Denise Pini.

Por causa da pesquisa, babalorixás e ialorixás levam para as salas de aula da tradicional universidade católica seus conhecimentos ancestrais. E caminham junto às coordenadoras do projeto, Denise Pini e Sonia Maria Giacomini, entre os prédios da PUC, onde já houve até gira de jurema, culto inspirado nos índios de Pernambuco. Tolerância máxima.

— É um novo fazer acadêmico baseado no respeito. Todos os detalhes do mapa, cores e símbolos são discutidos com o conselho de religiosos — conta a pesquisadora da PUC Sonia Giacomini.

Responsável pelos cânticos sagrados da Casa do Perdão, templo umbandista fundado em 1999, o administrador André Meireles Gomes de Oliveira, de 33 anos, nasceu em uma família católica. Há dez anos, descobriu sua nova religião, sem conflitos. Ele conta com a aprovação e o interesse dos parentes, com quem divide o culto ao Evangelho em casa.

Para ele, o respeito da sociedade pode ser obtido em paz. E com base nas leis.

— Em virtude do processo histórico de preconceito, as religiões se mantiveram escondidas. Agora é a hora, não de se exibir, mas de valorizar, mostrar a religião para a sociedade e combater o preconceito — explica André.

Para a professora Cida Abreu, de 40 anos, o estudo lançou luz sobre religiões afro, muitas vezes, vítimas de preconceito:

— Por que ninguém olha estranho para a batina de um padre, para a Bíblia de um pastor, e comenta sobre as nossas roupas brancas? Essas perguntas têm que ser feitas. E afirma sua religiosidade:

— Quando você está na entrega total da sua fé, na espiritualidade, a discriminação é irrelevante.
E ponto final.

Litoral surpreende pesquisadores

Ao dar à luz o primeiro filho, Rosilda Duarte, de 44 anos, conta ter tido um pressentimento: seu menino teria "uma missão especial". Dois anos depois, segundo sua fé, a intuição de mãe seria confirmada: um babalorixá disse que, adulto, o garoto se tornaria pai de santo.

Histórias como a de Pai Bruno de Omolu colorem o mapa religioso do litoral do estado. Ele fundou, em 2008, seu terreiro na casa de veraneio da família, em Itaipuaçu, Maricá. Esse cenário surpreendeu pesquisadores, que não esperavam a presença significativa de casas afro na Baixada Litorânea.

— Eu morava em Icaraí, em Niterói, e tinha casa aqui em Itaipuaçu. Dei a terra para ele. Somos registrados. Por que temos que nos esconder? O movimento contra a intolerância ajudou muito. Todo mundo nasce com uma missão. Um dia descobre qual é a sua — defende Rosilda.

Método da pesquisa

Chamada de bola de neve, a metodologia da pesquisa é realizada em rede. Lideranças do culto afro foram contatadas e indicaram as casas a serem mapeadas. O universo de 847 não representa o total de terreiros do estado. Mas o estudo dessa fatia revela características gerais, como o engajamento na área social, principalmente no combate à fome, com distribuição de cestas básicas em áreas de pobreza extrema.

— Essa pesquisa foi uma dádiva — brinda Denise, após desvendar os caminhos da fé.

Fonte: Extra

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